A MORTE DE INÊS
Que direi ? Que farei ? Que clamarei ?
Ò fortuna !Ò crueza!Ò mal tamanho !
Ó minha Dona Inês, ó alma minha,
Morta m' és tu ? Morte houve tão ousada,
Que contra ti pudesse ? Ouço-o e vivo ?
Eu vivo e tu és morta ? Ó morte crua !
Morte cega, mataste minha vida,
E não me vejo morto ? Abra-se a terra,
Sorva-me num momento, rompa-s' alma,
Aparte-se de um corpo tão pesado,
Que ma detém por força !
Ah ! minha Dona Inês, ah ! ah! minh'alma
Amor meu, meu desejo, meu cuidado,
Minh' esperança só, minh' alegria,
Mataram-te ? Mataram-te ? Tua alma
Inocente, fermosa, humilde e santa
Deixou já seu lugar ? Ah ! de teu sangue
S'encheram as espadas ? De teu sangue ?
Que espadas tão cruéis, que cruéis mãos ?
Ah ! Como se moveram contra ti ?
Como tiveram forças, como fios
Aqueles duros ferros contra ti ?
Como tal consentiste, Rei cruel ?
Inimigo meu, não pai, inimigo meu !
Porque assim me mataste ? Ó leões bravos !
Ó tigres ! Ó serpentes ! que tal sede
Tínheis deste meu sangue ! Por que causa
Vos não vínheis em mim fartar vossa ira ?
Matáreis-me e vivera. Homens cruéis
Porque não me matastes ? Meus imigos,
Se mal vos merecia, em mim vingáreis
Esse mal todo. Aquela ovelha mansa,
Inocente, fermosa, simples e casta,
Que mal vos merecia ? Mas quisestes
Como imigos crueis buscar-me a morte,
Não da vida, mas d' alma. Ó céus que vistes
Tamanha crueldade, como logo
Não caístes ? Ó montes de Coimbra,
Como não sovertestes tais ministros ?
Como não treme a terra e s' abre toda ?
Como sustenta em si tão grã crueza ?
António Ferreira, castro